Por Monica Peres – mperes@oceana.org
A Justiça Federal acaba de restabelecer a lista nacional de espécies de peixes e invertebrados aquáticos ameaçados de extinção (Portaria MMA no. 445 de 2014). Essa lista protege 475 espécies ameaçadas marinhas e de água-doce, incluindo os cavalos marinhos, o mero e várias espécies de tubarões e raias. Entretanto, ela estava suspensa por uma liminar do Tribunal Regional Federal (TRF) desde junho de 2015, decorrente de uma ação movida por entidades ligadas ao setor pesqueiro industrial, que defendiam a exploração comercial de várias destas espécies.
Em sua decisão, a juíza Liviane Kelly Soares Vasconcelos, da 9ª Vara Federal do DF, defende que o interesse econômico do setor pesqueiro não pode prevalecer sobre o interesse público de conservação de espécimes em risco de extinção, previsto em nossa Constituição Federal. Segundo ela, o objetivo da lista é justamente evitar a extinção de diversas espécies que o próprio setor pesqueiro reconhece como essenciais para a sua subsistência e bem-estar e garantir a manutenção das populações exploradas no médio e longo prazo.
Segundo Mauro Figueiredo, advogado e mestre em direito e política ambiental, “A decisão é de extrema relevância para a garantia do Estado de Direito Ambiental e consequentemente para o desenvolvimento sustentável da pesca no país. Interesses econômicos não podem sobrepor-se ao direito fundamental das pessoas a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. O poder público tem o dever constitucional de proteger a fauna e proibir práticas que coloquem em risco a extinção de espécies”.
De acordo com a Diretora Geral da Oceana, Monica Brick Peres, “o restabelecimento da lista de espécies ameaçadas é uma grande vitória para conservação da fauna brasileira”. Várias destas espécies tiveram suas populações drasticamente diminuídas, algumas, em mais de 90% de sua abundância, mas continuam sendo exploradas pela pesca e tendo seus ecossistemas destruídos. “Sem as listas oficiais, as espécies ameaçadas não são nem consideradas durante os licenciamentos ambientais. Isso tem trazido prejuízos imensuráveis, não apenas para o meio ambiente, mas para a economia e a qualidade de vida dos brasileiros e, especialmente, das comunidades ribeirinhas e costeiras” afirma Peres. “Agora é necessário que o governo e a sociedade trabalhem conjuntamente em planos de recuperação para restabelecermos a abundância natural destas espécies”.
Monica Peres alerta ainda que a lista de espécies marinhas ameaçadas trouxe à tona um problema gravíssimo, que é a total falta de gestão pesqueira no país. “Tentar suspender ou revogar a lista, não vai resolver o problema do setor pesqueiro, pois essa lista é apenas uma consequência de um problema muito maior e muito mais difícil de resolver”. A maior parte das nossas pescarias não tem nenhum controle ou normatização. Não temos um sistema de coleta de dados, nem pesquisa pesqueira, nem espaços de discussão com a sociedade e, muito menos, fiscalização suficiente. Isso tem levado a uma situação de descontrole e informalidade da atividade e, consequentemente, à sobrexplotação dos estoques. “Se nada mudar”, diz Peres, “vamos seguir assistindo de camarote ao colapso sequencial das pescarias, ao aumento vertiginoso do número de espécies ameaçadas em listas oficiais e aos enormes prejuízos socioeconômicos. Só temos uma saída: restabelecermos urgentemente o sistema de gestão científica da pesca. Isso tem que ser uma prioridade para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) que é o coordenador do sistema de gestão da pesca no país”.