Desfralde solidário: iniciativa transforma sobras de uniforme em roupas íntimas para crianças
A confecção de roupas gera uma grande quantidade de sobras de tecido. Pelo menos 20% da matéria prima é desperdiçada. No Brasil, anualmente são descartadas 295 mil toneladas de resíduos têxteis a partir das mesas de corte, de acordo com levantamento da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit). Grande parte desses tecidos acaba em aterros, levando décadas para se decompor, e liberando substâncias tóxicas no ambiente.
Levando em conta essa preocupação, o Programa de Recuperação da Biodiversidade Marinha (Rebimar) fez uma cuidadosa escolha de seus novos uniformes, para os próxios anos de projeto. O Rebimar é atualmente o maior projeto da Associação MarBrasil e reúne cerca de 40 pesquisadores em diferentes linhas de estudo no litoral brasileiro, do norte de Santa Catarina, passando por todo Paraná, até o sul de São Paulo. A iniciativa conta com o patrocínio da Petrobras e do Governo Federal, através do Programa Petrobras Socioambiental.
A escolha para confecção das camisetas foi pela confecção paranaense La Luz Brasil e levou em consideração a matéria-prima utilizada – algodão orgânico certificado – e a preocupação em dar um novo destino às sobras de tecido. Além de toda a preocupação com a sustentabilidade, a La Luz desenvolve o projeto Desfralde Solidário, no qual, para cada camiseta vendida, uma calcinha ou cueca é doada para as crianças em processo de desfralde das comunidades em vulnerabilidade social.
“Essas crianças raramente recebem doações de roupas íntimas novas. Somado a isso, o valor dessas roupas nem sempre se encaixa no orçamento das famílias. E mais, na fase do desfralde, elas chegam a usar 6 unidades por dia, pois sempre escapam um xixi ou cocô. Tudo isso já é argumento mais que suficiente para esse projeto”, afirma Fabiana Muranaka, proprietária e estilista da La Luz Brasil.
Os retalhos das 400 peças dos uniformes do Rebimar foram juntados com sobras da confecção de outras camisetas da LaLuz, permitindo combinações de cores que atendem meninas e meninos. Os tamanhos são ideais para crianças de 1 a 4 anos. “Geramos conforto e proteção para essa fase tão importante de toda criança e ainda aumentamos nosso compromisso zero desperdício”, reforça Fabiana. A produção das peças íntimas foi feita pela Cooperativa de Costureiras da Vila Verde, localizada na Cidade Industrial de Curitiba (CIC).
Fabiana Muranaka durante entrega na ACM Paranaguá. Foto: Raphael Sobania.
A entrega beneficiou 81 crianças atendidas pela Associação Casa Missionária (ACM Paranaguá), uma ONG que promove atividades recreativas, culturais e esportivas no contraturno escolar, localizada na Vila Maria, em Paranaguá, litoral do Paraná. A instituição atende crianças de 0 a 12 anos, cujas famílias vivem na área de um antigo lixão desativado.
“São famílias de coletores e trabalhadores, em sua maioria informais, que vivem em uma região com pouquíssima infraestrutura. Essa ação teve um impacto muito significativo para essas crianças. Foi emocionante ver a alegria delas ao abrir os pacotes com cuequinhas e calcinhas. Para muitas mães, a falta de condições financeiras impede que elas proporcionem aos filhos o básico para saírem das fraldas com dignidade, como roupas íntimas de qualidade”, destaca Mônica Monteiro Campos, presidente da ACM.
Marjorie Ramos, coordenadora de Educação Ambiental do Rebimar, destaca a relevância da iniciativa ao promover práticas sustentáveis que incentivam o repensar do descarte e dos processos de produção têxtil. “Trata-se de ressignificar o uso desses tecidos por meio de um ciclo que conecta diferentes frentes: as costureiras de uma cooperativa, famílias de uma região socialmente vulnerável e ações de educação ambiental. O objetivo é construir uma ponte entre o conceito de sustentabilidade e sua aplicação prática no cotidiano das pessoas, tornando a sustentabilidade uma realidade acessível e transformadora”, explica Marjorie.
Roupas para desfralde foram entregues para 81 crianças atendidas pela ACM Paranaguá. Foto: Raphael Sobania.
Dona Nercy Schneider é uma das costureiras da cooperativa parceira do projeto de desfralde solidário. Foto: Gabriel Marchi.
